quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Azul, viva, morta ou rosa




Há um tempo, discutindo- por muito tempo- com um amigo meu sobre o Andy Warhol, ele me colocou a seguinte questão: “tudo bem, a Marilyn Monroe tem um grande valor e critica uma série de paradigmas da arte e da sociedade. Mas ela- essa critica - só funciona por estar exposto dentro de um museu. Se eu me deparasse com uma das serigrafias da Marilyn Monroe em uma sala de estar, sem conhecer o artista que a concebeu e o seu significado, esse quadro não seria nada mais do que um retrato bonito da Marilyn Monroe.” Ele quis dizer que os questionamentos (que a gente esta cansado de saber) que essas serigrafias podem apontar a respeito da arte e a respeito da sociedade de consumo, estão necessariamente ligados ao fato delas estarem dentro de um museu. Que o ato em si de você colocar uma sopa Campbell ou a Marilyn Monroe dentro de um museu já é a critica e a obra do Andy Warhol, mas que essas imagens são vazias por si só.

Pois bem, na época eu fiquei meio encurralada por essa pergunta. De fato, se alguém que conheça a Marilyn Monroe e, no entanto, desconheça totalmente o valor artístico da obra do Andy Warhol, se deparar com qualquer uma das serigrafias da Marilyn Monroe em um lugar qualquer, este quadro não vai passar de um retrato um pouco estilizado da Marilyn Monroe. Na ‘Mr. América’, exposição que esta acontecendo na estação pinacoteca, eu tive a oportunidade de ver pela primeira vez ao vivo varias das serigrafias do Andy Warhol. Já de cara a primeira obra que eu me deparei na exposição foram as 6 Marilyns. E eu, talvez por ainda estar muito encucada com a tal questão, dediquei um bom tempo da minha visita diante delas. Já de cara, percebi uma coisa bem obvia, que, no entanto, tinha me escapado naquela ocasião, e que era fundamental para discutir questão da Marilyn: Aquelas serigrafias não são retratos perfeitos da Marilyn. Isto é, não somente pelas suas cores absurdas se tratando da pele ou da boca de alguém, mas também pelas mascaras de cor descoladas dos olhos e da boca como se a pessoa que a aplicou tivesse errado a sua direção, as cores do rosto da Marilyn não completam seu contorno. Ainda assim, quando penso nessas serigrafias dificilmente penso “nossa, como eram estranhas aquelas serigrafias. Os olhos e a boca dela estavam descolados do lugar, e como eram absurdas aquelas cores,a pele de alguém nunca teria aquela cor, que será que ele quis dizer com isso?” possivelmente eu só pensarei nelas como sendo um retrato da Marilyn. Na verdade, toda vez que eu penso na Marilyn a imagem que me vem a cabeça é de uma dessas serigrafias.

Aquela não é a Marilyn, é uma fotografia da Marilyn. No entanto eu nunca me relacionei diretamente com ela. Não olho para o seu retrato e penso ‘ retrato’, penso ‘Marilyn Monroe’, ela representa alguma coisa para mim, ela é alguém, não é simplesmente uma imagem. No entanto, da mesma maneira que eu não penso ‘retrato’ eu não penso ‘serigrafia da Marilyn Monroe’, eu penso só ‘ Marilyn Monroe’. Ela é a Marilyn Monroe independentemente do contexto da pessoa real ‘Marilyn’, seu significado é plano e único.Portanto, para mim, ela é apenas uma imagem.

O que eu quero dizer é que, quando vejo uma imagem da minha mãe ou de uma amiga querida, esta imagem me remete a uma serie de lembranças e experiências de toda minha vida até agora com essa determinada pessoa. Essa imagem não me remeterá necessariamente a uma lembrança especifica, e se o fizer essa lembrança especifica não será como uma outra fotografia parada, essa lembrança vai ter uma serie de sensações que a rodeiam e essas sensações são recriadas toda vez que eu penso nela, dependentemente de quem eu sou agora eu recrio a minha história. A vivencia que eu tenho com a minha mãe é dinâmica, é tridimensional, e a relação que eu tenho com a fotografia da minha mãe é resultado dessa experiência. No caso da Marilyn Monroe a experiência parte da imagem.

Uma representação feita em um quadro, por mais próxima que esteja da realidade, é intermediado pela mão do pintor que pode ter preferência por determinada cor, ou antipatia pela pessoa que esta representando. De forma que o seu gosto pessoal vai determinar aquela paisagem, tornando-a impura. Quando a fotografia e o cinema surgiram, o seu grande argumento era ser capaz de reproduzir a vida como ela é. Quem captura a realidade é uma maquina, um olhar mecânico que esta livre de intermediários. “Se alguém fizer uma determinada afirmação por exemplo ‘ o regime brasileiro é ditatorial’ posso dizer que não, que não é assim que penso, que esse é o ponto de vista de quem falou. Mas suponhamos que, graças a alguma mágica, a pessoa que fala sumisse e que essa frase ficasse solta, não como uma afirmação de alguém em particular, mas uma frase que existe em si[...]eu não poderia dizer que é um ponto de vista, que é a fala de alguém. Seria uma frase sem autor, sem intervenção humana”(Jean Claude Bernadet- “O que é cinema?”). O cinema tem essa ‘impressão de realidade’, de algo que existe. por que é capaz não somente de representar a realidade, como é capaz de recriar a vida em si, por que lhe confere o que é único, o movimento . Quando vemos um filme, somos capazes de experienciar aquela realidade que é dada, conhecemos seus personagens e nos tornamos íntimos da sua maneira de viver. Portanto, quando eu vejo a Marilyn Monroe ou algum outro ídolo de cinema ou televisão, é como se eu o conhecesse. Tenho algum repertório a respeito daquela pessoa que me permite construir algum sentimento em relação a ela. No entanto A Marilyn Monroe morreu muito antes de eu nascer,eu nunca experimentei de fato uma relação com ela, ela nunca se referiu a mim, nós nunca trocamos um olhar e eu não faço idéia nem de qual era o tamanho dela, a cor da sua pele. Mas eu não acredito que a minha relação com ela é essencialmente diferente da de algum contemporâneo seu, por que tanto pra mim quanto pra ele essa relação independe dela estar viva ou não, ela é sempre a Marilyn, viva ou morta, azul ou rosa.

Portanto, voltando a questão do meu amigo; Sim, se você se deparasse com uma das serigrafias da Marilyn Monroe em uma sala de estar, talvez nem percebesse se tratar de um objeto artístico, veria apenas um retrato bonito da Marilyn. No entanto, exatamente a falta de estranheza em relação a esse retrato, às suas imperfeições e inverosimilhanças, são o ponto mais alto do seu valor artístico. A escolha de uma foto em que ela parece tão triste e os borrados das mascaras serigráficas dão a Marilyn um caráter fantasmagórico, ela parece mais um Zumbi do que uma Musa. Por que ela é uma mulher de carne e osso, morta, cuja a existência se resume na sua imagem e ao mesmo tempo lhe é, de certa forma, negada. Ela esta(ou é) no outro lado do espelho. E nós, por estabelecer uma relação com ela, nos projetamos nesse mesmo lugar.

Bibliografia:

Jean Claude Bernadet - O Que é Cinema (ed. Brasiliense, Coleção Primeiros Passos)

Rodrigo Naves Warhol, evidência e tristeza – artigo no estadão.

terça-feira, 25 de maio de 2010

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